11.27.2020

 Hoje venho anunciar o fim do mundo

Ao olhar quente

Dos meus olhos dentro dos teus

Na brevidade da flores

Colhidas nos teus seios

Pelas minhas mãos

Mãos que entendo e não entendo

Oh céu limpo dos que voltam

Como são felizes os rostos tomando os 

verdadeiros rostos

As folhas o verdadeiro lugar

Dois velhos à varanda voltando a ser crianças

Há flores a nascer dentro dos pássaros

E pássaros a nascer dentro de nós

Depois as folhas recuperam os sentidos

Nas saliva tremendo na boca

Agora sigo perfeitamente para frente

Canto-te com os meus lábios a roçar as nuvens

Que verdade absoluta

Que feridas tão caladas

Que suspiro de alegria de um cais onde só parto

Do morno do teu pescoço

Agora sei que parto e só fico na infinitude dos teus cabelos

Aperto-te mais que os braços da terra contra mim

E eis o além: O milagre de te amar.


manuel feliciano

11.11.2020

 Tenho medo de uma pedra

Ser meramente uma pedra

Sequestro

A terra pousada em silêncio

Os pardais adormecidos nas árvores

Urge a tua voz

De terra lavrada

Sementeira a abrir os poros da pele

Do impossível dos seios descobertos

O meu corpo e o teu 

Envoltos em lençóis de vento

Quero locomover-te

Escrever-te o amor

Com os lábios no corpo

E no vazio

Das mãos e uma pedra

As palavras da seiva de uma árvore

Fome de já ter sido

Ramo a rebentar num barco

Flor

Pubis regada

Fruto a arder nos lábios

Grito de giestas e animais

O teu vestido a quebrar as ondas do mar

O eco

O estremecer da terra

Luz dentro e fora

Fora e dentro

Nos lábios que se abrem

E fecham a latejar

Pedra líquida a desfazer-se

Umbigo

Ancas em flor

Saliva, noite quente

Noite fria

Fundura

Alimento

Buraco negro

Big bang

As nossas almas

Vagabundas

Já fora do espaço

Circundante

Cadeia alimentar 

De libelinhas de azul

Animais  e seres libertos

Não mais mortos

Criação.


Manuel Luís Feliciano

11.05.2020

 Poema



Poema


Era em ti que existia o impossível

A profundidade do mar

O vazio do céu

Ainda eram possíveis

Mas o calor das tuas mãos

Os teus lábios a tocarem nos meus

É que era definitivamente o impossível

Um fogo permanente

Um lugar seguro

O fim do mundo

Uma rua sem direção.


Manuel Luís Feliciano

Poema

Poema


O teu olhar é magia, 

Respiração 

Início de flores

Ventre

Amoras silvestres, 

Mãos que afagam,

Coração que inebria

 Beijo 

 Luar, 

 Fogueira 

Cintura

Vereda

que aquece

De mãos 

A abrir o sol

A promessa

O escuro

A fome

Abraço 

Corpo de seda

Nús

Crianças sem nada

Semeia

O teu beijo

Casa

Lume

Fios de amor 

Saliva

Terra que transpira

Semente

Choro

Barco

Na voz

E garganta

que enrouquece

Luz

Aroma

Névoa

Primavera

Bicada de pássaro

Inocência

Flor molhada

Despropriação

Sou-te

Primeira

Árvore

Solo

Homem

Formiga

Choro

Calor

Frio

Ao teu vento

Inverno

Rastro de estrela

Passagem

Apropria-me

Ininterrupto

Nasço-te.

Manuel Luís Feliciano

Outono

 Hoje

Quero levantar-me

Andar pelo chão

E se vir na terra

O chão plantado de folhas

As vozes em silêncio

Eu a olhar para ti

Tu a olhares para mim

Em segredo

Num bulício de cores

E o que dissermos um ao outro

For o céu profundo

Quase a chover

Promessa de um fogo

É o Outono


Manuel Luís Feliciano


O Teu Sorriso

 POEMA


Vim aqui para te dizer que o teu sorriso é sublime. Dentro dele há uma luz que se liga a outras luzes! Será que  nasce do perfume da chuva? Que contagia o orvalho que dá de beber ao polén das flores, faz nascer o sol, ergue as montanhas, dá de beber às fontes, desce pelos rios, movimenta as ondas do mar, dá luz à  luz? Será uma Deusa o teu sorriso? Um cometa? Uma nova era, uma sinagoga? Um novo acordar, uma cidade inteira, uma brisa, um anjo crescente, os navios a partirem nos lábios, as mãos abrigadas no por do sol? Que Deusa é essa o teu sorriso? O infinito? O Paraíso? O encontro? A ponte que nos liga ao paraíso. Um astrolábio para chegar a terra.  As caravelas, a ilha do amor, a nudez das palavras, o sexo das rosas? O silêncio desvirginado, os índios da Amazônia?Ainda que o beba num trago de luz, e o saboreie com os lábios e a boca, em intermitências de pálpebras silvestres, o mastigue e o coma, só as tuas mãos a percorrerer-me, a incendiar-me, atravessar-me o caos e as cinzas molhadas de beijos, ruínas a erguerem-se num gemido de brisa. As ancas tépidas. Flor de estrela. Água  a bilhar a quebrar a Antártida. Os olhos a transbordar de amor. Novos gritos de estalagmites na garganta. Pétalas de sal. Corpos desnorteados. Saliva de cais ardente. Chaimite de guerra. Não sei que sorriso é esse? Cumpre-me bebê-lo num gole de luz.


Manuel Luís Feliciano