5.31.2014

Talvez eu nunca amasse
e o meu coração um barco
dentro do teu mar

Talvez eu nunca ouvisse
E os meus ouvidos
a tua boca a chorar de amor

Talvez eu nunca visse
os meus próprios olhos
As tuas sobrancelhas num jardim

talvez eu nunca andasse
fosse o peso dos teus pés
na minha boca a florir

talvez eu nunca fosse
E a minha própria sombra
o teu corpo chão que dá pão

talvez eu  nunca nascesse
E tu saliva e chuva
Envolta na minha carne

Talvez eu nunca morresse
E tu fosses o outro espaço
a outra altura do meu ar

talvez eu nunca existisse
E dentro de mim amanhã
As tuas mãos sol a nascer

Talvez eu não fosse a solidão
mas um pouco dos teus lábios
Juntos dos meus a arder.

manuel feliciano

5.20.2014

Quando eu me achei dentro dos teus olhos
Eu perdi um pouco do meu sangue
Um pouco da minha voz, um pouco mais de mim
A tua boca florida
Sempre florida e desejada maçã
Entre as nossas bocas

E eu e tu de tanto esperar
Um barco inchado dentro de água
A minha garganta e a  tua
tantas vezes, eu te beijei tantas vezes
nessa minha e tua espera
Como esse barco
A experimentar a humidade do nosso corpo
E a árvore verdejante
Ainda inteira


No mais íntimo de mim
Eu fui contigo
Tu és o ar possível que me alimenta
O pouco Sol,
O pouco sangue
O pouco sal
Nas paredes sem mais nada do meu corpo

É o teu perfume que eu quero
E não o das rosas mais castas
É o teu útero
E a tua água morna

Não me morreste,
mas seja talvez a hora de eu ser mais límpido
Mais tua saliva
Teu tacto de pássaro e ninho pousado
A Despir o céu
A debulhar-me os lábios
Num dia em que o sol se afoga
A semeares-me
entre o teu tronco e os teus seios
No teu calor
De outro sol e outro céu


Eu hoje compreendo as pedras
E as mãos tenras que nelas moram
Os lábios suspensos na circulação do vento
Os seus olhos quase como uma flor
Húmidos entre os meus
Ainda numa semente à espera da terra do meu corpo!


Manuel Feliciano