2.17.2015

Diz-me que és mulher
Que tens carne, e lenha que arde na lareira

E o teu tronco inteiro por cortar
Que ateia as raízes, movimenta os ramos
Com o hálito fresco
E grão que se te abre
Que tens boca e azuis de céu
E porventura estrelas
E que dentro de ti há fundura onde me possa abrigar
Com se em ti não nasça o dia
Como se em ti não se ponha o Sol
Como se em ti os lábios não morram
É por ti que chegou a Primavera à cidade
É por ti que as flores morrem tão depressa
É por ti
Que tens no coração um cotovelo
Que não te deixa debruçar  quando as pétalas caem...
Que todos os dias o sol
Dá os beijos que não sabes dar
Conheço-te
Não vale a pena fugires da renda da minha saliva

Que te borda o corpo
Se soubesses o quanto o teu Adeus
É árvore que em mim ganha asas
Na qual deitas o teu corpo à sombra
Fresco de névoa e brisa
E maçã
Que trincas com a tua própria boca

Porque é que ainda me voltas
Nessa voz com que me trazes
Uma mão de sorriso degolada
Deverias saber matar melhor
A mim não, porque em ti eu só te nasço
Em uvas do Douro dentro do teu vale

Da mesma forma que as abelhas
Despem o pólen das flores
E a brisa arranca o Bâton das rosas.


Manuel Feliciano

1.30.2015

De ti eu não tive um beijo
O teu lado branco
O teu lado escuro
nem aquele olhar
que movimenta sol
ou gesto de pão
Que volta para o trigo
Só as tuas mãos
pobres num suspiro
O amor sem fundura
a desenhar-me os lábios
sem o pricipício
onde eu te morra
De ti só aquelas flores
Que nunca foram flores
Mas que em mim floriram!
O que eu queria de ti era estrela e não o céu
O que eu queria de ti era porta e não  a casa
O que eu queria de ti era a erva e não o chão
O que eu queria de ti era o mel e não a abelha
O que eu queria de ti era uma mão fechada
Que me abrisse os lábios na curva dos teus joelhos
O que eu queria de ti era uma nuvem cinzenta
Que chovesse quando os teus beijos queimam
O que eu queria de ti era um rélogio
Feito de beijos e abraços a estalarem em girassóis
OS NOSSO OLHOS SEMPRE CRIANÇAS
RECITANDO FLORES NA PELE CARCOMIDA
DE MAÇÃS DESEJANDO FLORES 
SEMENTES IMPLORANDO TRONCOS
GEMENDO O PERFUME DE LUARES
DE VELHAS AS NOSSAS MÃOS
AFONGANDO-SE NO MAR
AINDA NOVAS TREMENDO COMO FOLHAS
INCHADAS DE BRISAS QUE NÃO ADIAM
O ESTREMECER DAS PERNAS NAS TUAS PERNAS
NEM SE PÕEM NA NUDEZ FAMINTA DAS BOCAS
QUE MASTIGAM O POR DO SOL
DENTE POR DENTE E SALIVA
SEM O AMANHÃ   DE OLHOS QUE SE FECHAM NO INFINITO
O que eu queria de ti uma campa aberta
Onde eu pudesse dentro de ti NASCER!


Manuel Feliciano

1.29.2015

Tenho no meu coração o perfume de um mendigo
Que veste as ervas solteiras que nascem nas bermas da estrada
É preciso que as nossas raízes por mais que se alastrem
Voltem sempre ao nosso tronco
E à água que ilumina as nossas bocas
Sejamos ruas, flores, jardins, por vestir 

No fundo da minha tristeza há um pomar
Ainda à espera das tuas mãos cheias de fogo
Que trazem a chuva onde tudo está seco
Sejamos também amor, almas libertas
Asas de pássaros sem chão onde pisar

No meu coração estão todas as rosas por nascer
Tenho as minhas mãos doridas de amor
Da tua voz profunda que nelas corre

Oh minha amada, que as lágrimas que possam chegar
Sejam sempre tuas sementes em meu corpo
Pequeno que jaz à luz de tão mendigo
E tão de amor como o lenço de Verónica em Jesus Cristo
Menstruando aurora de nossas mãos gastas

Dispamos este corpo que já não nos cabe
Sejamos rio que corre sem encontrar o mar
Esqueçamos os olhos que trazem a escuridão às rosas
Sejamos noite de corações iluminados
Árvores de braços abertos ao céu

Que belo é o amor que cresce no chão como erva
ramo que de tão cego se entrega ao pássaro
Quão bela é a semente que voa pelo vento
E não escolhe a boca onde desabrocha o beijo

O verdadeiro amor é aquele que crucifica
E deixa o coração tão leve como as aves 
Dá-me a tua mão limpa com a escuridão dos teus olhos
E vive em meu coração sem a dor do tempo
Do vento seco que cresta as palavras como a areia.

Manuel Feliciano
Ainda tenho os teus joelhos
dobrados no meu coração
perdoa-me
não os consigo desdobrar!


Manuel Feliciano

1.11.2015

Em tua memória meu amor Giovanna Morocco


 Se eu pudesse reencontra-te
No meio da multidão que passa
São tantos os rostos profanos de algodão e linho
mergulhados no meu coração
Que não caberiam em nenhuma rua
Dos quais eu não consigo ver o mar
Tu que és da luz que envolve a lua
Que chama a semente ao canto dos pardais
De campo amplo, onde semeio os meus lábios
Na tua respiração e me reconheço
Eu que de ti conheço  o rosto
O teu tronco
As tuas raízes em mim espalhadas
A tua semente inteira
Como posso eu
Dar-te carne flor e maresia
Ser fogo e aquecer-te de todas as primaveras
Chamar-te  com a minha voz que é da tua água
Na qual correm os teus cabelos e o teu sangue
Dar-te um beijo e em mim fazer-se dia!


Manuel Feliciano