5.02.2010

A existência deturpa todos os caminhos

Meu amor, no dia em que te quis dar as mãos
Estava enredado na mentira que é o mundo
Eu amadureci nos ramos de numa árvore de pedra
Tive que crescer e ser fruto e comer-me a mim mesmo
Da vontade e desejo só vi a praia onde outros se sentaram
Permiti-me então que fosse terra e me cultivassem
Ao primeiro dia queimaram-me todos os arbustos secos
Ao segundo dia cavaram-me para arejar todo o meu corpo
Em lua apropriada colocaram-me todas as sementes
Até hoje espero sobre armaduras de ferro que elas nasçam
Sou completamente alheio a fenómenos exteriores
Devo dizer que, quando o sol se põe ao fundo das melancias
Entre o rubor do ventre e das sementes húmidas de Agosto
As línguas e as bocas estão mais alegres que a minha alma
A alegria é a ponte sem pilares que ilusoriamente atravessamos
Não me peçam para subir as escadarias pela melanina dos sonhos
Que pinte com alegria e amor palavras sem lugares generosos!
Se as tuas mãos fintassem de uma vez por todas esta mentira
Eu pelo menos dormiria pensando que a morte é o que menos pesa!


Manuel Feliciano

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