7.09.2011

Poema do desconhecido

Nas entranhas das uvas em videiras

Alagando o vale da minha alma

Eram de água as pedras nas raízes

Os esteios pontos onde se cruzam

Os olhos que poderiam ser só terra

A terra que poderia ser só sombra

Mas eu crepintando, na folhagem

Entre os arames das ramadas

sou mesmo se a luz não tem mar

sou mesmo se a chuva não tem mais carne

Porque os castelos são de fumo

E o fumo é de terra

E a terra o coração

Ah como as videiras choram e as lágrimas não são suas

E gritam por uma casa envolta num mistério

Uma boca dourada que lhes beba o sangue

Ah mémoria de um impulso que reencarnou um corpo

Por uma morte que nunca aconteceu

Porque já aconteceu e ainda está tudo vivo

O mundo é surreal como todas as paredes

Paredes que são vácuas

Mas são paredes

Estrelas que não têm luz

E luzem

Olhos com cataratas que vêem

Ah materialidade imaterial dos gestos e das coisas

Do que se aperta e desaperta

Projecção elástica de estar vivo

A morte é agora quando abres as asas

E a brisa cardíaca inaugura todo o corpo!

O corrimão que não quer saber das mãos

Cadáver musical de uvas

Por entre a clave dos dentes!



manuel feliciano

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