8.07.2010

Quem me deu este lugar

Quem me deu este lugar
que eu não reconheço as casas
feitas de madeira e caruncho
quem me deu a maçã de adão
que estava podre por dentro
quem me disse navega pelo monte
num barco de calhaus de pedra
quem me apresentou o Job
e me deu vinagre por vinho
quem foi o judas que me traiu
quem me pregou num madeiro
tornou meu corpo num degelo
quem me deu uma mulher
burguesa de luvas brancas
que afinal é a espondilite
mas que ama com ternura
mas não está à minha altura
é uma bela cafetina
quem rasgou a minha agenda
quem me cuspiu no amor
quem é que inventou a liberdade?
quem me desfeitiou o Eu
quem me prendeu mesmo sem cordas
e me trocou todas as voltas?
já não tenho sim nem não
já ninguém me acredita
deixa-me me ir envenenar
no jardim da minha infância
há fome e sapatos rotos
mas isso é uma alegria
e flores a brotar nas lágrimas
olha um campo de flores em frente
prados verdes e passarinhos
corro atrás de borboletas
voo sem corpo e sem alcance
bebo o azul do céu em sumo
mil anjos falam comigo
a morte nunca existiu
vai-se para casinhas no céu
que fizeram aos meus olhos
que hoje quase não vêem.

manuel feliciano

1 comentário:

  1. oi
    Gostei muito deste poema!
    Continua a escrever!
    Não desistas da poesia!

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