O sol arrastado à cabeça de uma junta de bois
E tantos de nós com as pernas
Lavradas nas entranhas da terra…
Na aliança de dedos sem aneis
Disseram-me para esperar foda-se
Coisa estranha a puta da espera
Os braços sem braços
As pernas sem pernas
Até para nascer eu tive que esperar
Mas se ao menos esperar valesse a pena
Para a puta da vida me abrir as pernas
Estes dias de Ulisses na ilha de Calipso
E a Penépole a tricotar na minha garganta
Seriam ainda alguma coisa
Senão hoje vai ter mesmo que ser
Comer um desejo embalsamado
Esperar por uma noiva que tarda em chegar ao altar
E pensar o céu num canteiro
E ter que fazer disto um navio
E ter que fazer disto um Deus amável
E ter que fazer disto uma vida de santo
E ter que fazer disto um doce veneno
Depois que os bois lavraram estas entranhas
Há ratos à superficie
E as cobras atentam contra os ratos
E os ratos fogem da cobras
E eu fujo de tudo isto
Será que eu sou daqui caralho?
Deste jogo de cabra cega
Batendo com os cornos no muro
Como se não haja muros e cornos
E se ao menos o que eu digo fosse uma curta metragem
Mas não…esta merda é crometrada em câmera lenta
Para ser chupada
Lambida
Expurgada
Para entrar no céu completamento limpinho
Sem a toxiciade da nicotina
Não fossem os meus sonhos
A medula de uma pedra
Onde é que estavam todos os meus Deuses?
Onde é que eu poderia tomar um duche
Na maçaneta de uma porta
Onde é que eu poderia estar contigo definitivamente?
Com ternura
As mãos frescas e prontas
Com inocência e vulva
Na boca fresca da brisa
Com os joelhos em sangue nos meus olhos
A lembrarem duas flores vermelhas
Ah não vou gritar porque nenhum Deus vem salvar o mundo
Porque os Deuses também são escravos
Porque os Deuses esperam por tudo
Porque os Deus também são vítimas
Porque os Deuses também estão fartos
Desta máquina enferrujada que tinha que ser podre para ser vida!
manuel feliciano
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