4.19.2011

Páscoa

Pensas que amei essas lágrimas em cachos

A voz abrindo-se no útero das tábuas

As palavras nos ouvidos dourados das folhas

O coração sempre do mesmo lado

E os pregos no lugar dos dedos

As andorinhas ácidas na boca



E o amor de mãe em carne viva



Pensas que fiz uma vénia à múmia do mundo

A latejar de morte

E clamei pela casa desfeita

Num sorriso derrocado

E amei os gestos sem nenhum umbigo

Pensas que exaltei



As coxas da neve

Uma árvore despida

E as moedas de César

A espada que nada sabe da ternura

E os lábios que tudo sabem sobre a espada



Pensas que quis

Toda a brutalidade do homem

A podridão dos seus actos

Toda a alma suja e porca

Neste altar feito de esperança

Íngreme como um luar de Inverno



Quero que saibas ainda hoje que:





Vomito o chão e as suas visceras

Digo à brisa para expurgar o sal

À boca para não saber mais de si

Aos olhos para se envergonharem

Ao corpo para se desfazer nas nuvens

E ao sol que não traga consigo uma cruz

E o teu sangue que seja sempre uma flor a nascer

E a tua dor uma ave que quebre todo o céu rochoso!







manuel feliciano

3 comentários:

  1. gostei muito, nunca percas a inspiração.
    Carla

    ResponderEliminar
  2. Manuel Feliciano,

    O pouco que tive a oportunidade de ler, adorei a forma, o conteúdo, as possiveis mensagens que podem ser interpretadas, o jogo de palavras que a poesia permite e ... como o faz tão bem! Os meus sinceros parabéns e também agradecida pelo seu convite como amiga no facebook, é um grande prazer!

    ResponderEliminar
  3. Eu é que agradeço, e sinto-me pequeno ante as suas palavras:)

    um abraço

    manuelfeliciano

    ResponderEliminar